DICA DE FILME ("RONIN")

Dica de Filme

Ronin
1998
Direção: John Frankenheimer


EXEMPLO PERFEITO DE FILME DE AÇÃO INTELIGENTE, "RONIN" CONTINUA INSUPERÁVEL EM MUITOS PONTOS

Criou-se um enorme estigma relacionado aos filmes de ação nos últimos anos, de que esse tipo de cinema só funciona se você "desligar o cérebro, e se divertir". Claro que há um completo exagero nessa expressão, mas, não deixa de ser evidente que, realmente, a maioria dos filmes de ação são, em essência, "burros", ou, pra ser mais específico, é aquele tipo de produto que subestima demais a inteligência do espectador. 

Portanto, os (poucos) exemplares desse gênero que possuem algum diferencial precisam ser enaltecidos. Então, salve o saudoso cineasta John Frankenheimer, que já no final de sua carreira nos presenteou com o petardo chamado "Ronin", que, sem exageros, coloca os vários "Velozes e Furiosos" e "John Wicks" da vida no chinelo.




A história é, aparentemente, simples, mas, possui diversas camadas interessantes, e que possibilitam muitas reviravoltas ao longo da trama, mas, que não são forçadas e se integram perfeitamente À narrativa de maneira orgânica. De início, uma sequência um tanto trivial, num bar localizado em Paris, com alguns dos protagonistas entrando e saindo do local. 

O clima, a trilha sonora e a fotografia criam uma certa tensão, que não se concretiza ao término dessa sequência. Isso porque o filme, habilmente, vai testando alguns dos clichês do gênero, e meio que avisa: "não entregaremos nada de mão beijada". Corta pra outra sequência aonde começam a ser apresentados tanto os personagens principais da história, quanto a história em si.

Esse é um dos momentos cruciais da trama, pois expõe muito dos protagonistas (todos, por sinal, criminosos, e que estão ali para um serviço que vai lhes render muito dinheiro). 

Sam (Robert De Niro) é um cara misterioso e muito cuidadoso em seu ofício. O mesmo pode se dito de Vincent (Jeam Reno), este, sendo um pouco mais calado do que Sam. Já, Spence (Sean Bean), ao contrário dos dois, é mais extrovertido, porém, bem mais imprudente e nervoso. Completa o time Gregor (Stellan Skarsgård), que dá suporte tecnológico a eles, e Larry (Skipp Sudduth), que servirá como uma espécie de "guarda costas" para o grupo. Quem comanda tudo é Deirdre (Natascha McElhone), que recebe ordens de quem contratou o grupo. 

A missão? Roubar uma mala de uma outra organização criminosa.




Qualquer outro realizador teria entregue um filme bem simples, raso de roteiro, com personagens caricatos, frases de efeito a rodo e cenas de ação bem feitas tecnicamente, mas, pouco impactantes. Mas, aqui, estamos falando de um veterano do quilate de um John Frankenheimer, diretor de "Sob o Domínio do Mal" e "A Semente do Diabo". 

E, com tanta experiência acumulada, o que vemos em "Ronin" é um filme de ação sério, classudo, com algumas poucas tiradas engraçadas (mas, eficientes), um roteiro muito bem elaborado, diálogos afiados e uma direção segura, prendendo o interesse pela trama em quase duas horas de duração. Some-se a isso algumas das cenas de perseguição de carros mais fantásticas do cinema, usando apenas efeitos práticos, e com dezenas e dezenas de carros destruídos. Muito mais empolgante do que o CGI matreiro de "Velozes e Furiosos", por sinal.

Na verdade, "Ronin" está mais para os melhores momentos de John Woo do que para esses blocbusters hollywoodianos, o que já começa pela construção dos personagens, todos ótimos. Não há um deles, sequer, que seja descartável à trama, até mesmo um que, de certa forma, não "deveria" estar na missão. 

Porém, até ele desempenha uma função bem específica dentro do enredo, que é para mostra que ninguém ali irá permitir falhas. Em qualquer outra produção, tenham certeza de que esse personagem ficaria até o final, fazendo um sem número de burrices, e atrapalhando o clima da trama. Aqui, no entanto, o buraco é mais em cima; o nível é outro. 

A interação entre os outros personagens também é otimamente bem arquitetada, principalmente, entre Sam e Vincente e entre Sam e Deirdre. Até aqueles que parecem bem secundários, como Jean-Pierre (amigo de Vincent, e que vai justificar o título do filme), possuem uma função dentro da trama, não sendo nenhum desperdiçado.




Claro que nada dessa orquestra afiadíssima funcionaria sem a ajuda dos atores, todos muito bem em seus papeis. De Robert De Niro e Jean Reno, pouco a se falar, não é verdade? Ambos são quase sempre excelentes, e aqui não é diferente. 

Mas, fora eles, há outros ótimos destaques, como Natascha McElhone, Stellan Skarsgård e Jonathan Pryce, todos entregues a seus personagens de forma muito convincente. E, o maestro de tudo isso, John Frankenheimer, assim como George Miller fez em "Mas Max: A Estrada da Fúria", mostra que, em muitos casos, experiência conta, sim, pois, tanto a sua forma de conduzir a narrativa nos momentos mais "calmos", até as cenas de ação mais explosivos, são primorosas, extraindo das cenas todo o seu potencial, sem deixar nada forçado, estranho ou caricato. 

Talvez, só na sequência do balé no gelo que o filme perca um pouco desse clima, porém, quando a ação recomeça, tudo volta aos eixos.

Provavelmente, quem está bastante acostumado com o recente "cinemão" de Hollywood, talvez estranhe "Ronin", e sua ambientação mais séria do que o normal. Porém, quem ainda possui na memória produções do tipo "Operação França" ou "A Outra Face", vai se familiarizar com um tremendo filme de ação com alma e sangue nos olhos, além de ser bastante inteligente em sua abordagem. 

Tudo bem que não é o tipo de filme que, em geral, é feito hoje em dia, mas, em nome de um cinema de ótima qualidade, vale a pena sair um pouco da zona de conforto, e assistir a esta pequena obra prima. 


NOTA: 9/10


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