Filme Mais ou Menos Recomendável

Watchmen - O Filme
2009
Direção: Zack Snyder


No cinema, existe algo chamado "fio narrativo". Pode parecer óbvio, mas, para que uma história seja bem contada é preciso que quem esteja narrando tenha fluidez ao contar os fatos. Pode até parecer simples, porém, não é. E, "Watchmen - O Filme" expõe bem esse defeito, que não apenas se tornou recorrente no cinemão hollywoodiano, mas também no próprio trabalho do cineasta Zack Snyder. Talvez, os melhores filmes do diretor sejam seus dois primeiros ("Madrugada do Mortos" e "300"), justamente porque eram produções cujas histórias eram naturalmente "fakes", mais cheias de pose do que de conteúdo. "Watchmen" nos quadrinhos, ao contrário, possui uma incrível história para contar, cheia de significados.

A questão é que Snyder, entra ano e sai ano, vem se mostrando um bom "arquiteto" de imagens, mas, que se embrulha todo quando o assunto é narrativa. Sua obsessão quase anormal em filmar, ipsis literis, uma obra como "Watchmen" demonstra bem isso. Nos dez primeiros minutos deste filme, temos um longo videoclipe, regado a uma música de Bob Dylan, que se propõe a contar a vida (e tragédia) de vários heróis, que outrora eram gente querida pelo povo, mas, que caíram em desgraça por motivos, muitas vezes, banais. O problema é que a sequência é exageradamente grandiloquente, com uma irritante câmera lenta, aonde os personagens parecem que estão fazendo pose pra foto o tempo todo. Não há espontaneidade, não há carisma, não há identificação. Cansa fácil.




Só que essa maneira de filmar vai permear as mais de três horas do filme, e ao final, o espectador irá perceber que, se tivesse evitado exageros, o longa poderia ter, no máximo, duas horas (e, olhem lá). Sim, compreendemos que os heróis da história, que antes eram louvados, hoje, estão decadentes. E, que é a partir da morte de um deles, o Comediante, uma série de eventos vai tornar a vida dos mascarados cada vez mais complicada, visto que o mundo é outro (aqui, estamos no auge da Guerra Fria), e a própria concepção de super-heróis está ficando mais cínica e obsoleta.

Nisso, conhecemos alguns que abandonaram sua carreira de heroísmo, como o Coruja e a Espectral, e outros que passaram a trabalhar para o governo, como o próprio Comediante e o Dr. Manhattan. Em paralelo, temos Adrian Veidt, que era o herói Ozymandias, e que antes de ser implementada uma lei proibindo a atividade dos mascarados, resolveu revelar sua identidade secreta para o mundo, e assim, construir um grande império econômico. É justamente no funeral do Comediante que as coisas se complicam, pois um herói renegado, Rorschach, resolve investigar por conta própria o que está por trás do assassinato.




Só que pra chegar em todas essas questões, há uma demora considerável. A preocupação parece ser tudo, menos a história em si. Ao contrário, somos bombardeados por imagens contemplativas que misturam frases de efeito e ação desenfreada. Pelo menos, a primeira metade do filme é SÓ isso, e pouco se salva, como algumas frases soltas de Adrian Veidt ou do Dr. Manhattan, que dão o cerne de como a sociedade está imersa na violência. Mas, pelo menos, temos, nesses primeiros momentos, uma sequência bem elaborada, que é quando, por flashbacks, vemos o Comediante e o Coruja dispersando uma manifestação de civis contra os super-heróis. O Comediante usa de extrema violência, e indagado pelo Coruja aonde foi parar o sonho americano, ele diz: "O sonho americano virou realidade."


É então que vemos as possibilidades desperdiçadas no roteiro. Algo que poderia soar mais provocativo, mais ousado, mais interessante, acaba sendo, na maioria das vezes, algo vazio, sem alma, sem ritmo. Talvez, como diferencial, alguns até estranhem as várias cenas de sexo e bastante violência gráfica que a produção possui, algo realmente incomum para filmes de super-heróis. Mas, são coisas, geralmente, mostradas fora de contexto, ou que nada acrescentam à trama. Trama, essa, inclusive, que vai aos trancos e barrancos até perto do final, quando, finalmente, o filme atinge um grau superior de qualidade. Quando alguns segredos são revelados, e vislumbramos um andamento incomum, que não envolve a velha dicotomia bem x mal, aí temos que dar o braço a torcer. Nesses poucos minutos, o filme realmente se mostra acima da média, e empolga. Mas, até chegar aqui, muita coisa foi desperdiçada.





Tecnicamente, o filme é competente, mas, são tantos efeitos especiais deslocados, que até fazem parecer que os realizadores estavam mais preocupados com as imagens que iriam estampar as publicações de entretenimento mundo afora do que qualquer outra coisa. Do mesmo jeito, a trilha sonora tem gente acima de qualquer suspeita, como Bob Dylan e Jimi Hendrix, porém, mais uma vez, tudo desperdiçado em nome de mostrar algo que se assemelha mais a um videoclipe do que um filme pra cinema. Já, as atuações, essas, pelo menos, são boas. Patrick Wilson consegue passar o sentimento de relutância de um Coruja em voltar aos velhos tempos, enquanto Billy Crupud e Matthew Doode fazem de Dr. Manhattan e Ozymandias, respectivamente, personagens cerebrais, levantando algumas questões filosóficas realmente pertinentes. O restante do elenco também está muito à vontade, o que salva a produção em muitos aspectos.

Sabem aquela máxima: menos é mais? Não no cinema de Zack Snyder. Quando fazia filmes em que era a ação pela ação, tudo bem. Mas, quando pega uma história em que precisa de um desenvolvimento mais profundo, seus excessos escondem sua falta de habilidade em contar bem uma história. Nas hq's, "Watchmen" foi uma obra visionária. No cinema, virou apenas mais um filme cheio de barulho e pose, com alguns momentos que são verdadeiramente bons. Prova de que técnica apurada não vence conteúdo. Comparado até a outras produções do gênero que temos por aí, "Watchmen - O Filme" está até alguns degraus acima. Só que apenas isso, como sabemos, não é suficiente.


NOTA: 5,5/10

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