Dica de Filme

Viva à Liberdade
2013
Direção: Roberto Andò


Nem sempre a primeira impressão ser diferente do previsto é algo necessariamente ruim. Peguemos como exemplo o filme "Viva à Liberdade". Além da produção ser italiana, o enredo fala da troca de papéis por irmãos gêmeos. Seria de supor que se trata daquelas comédias escrachadas, em tom de besteirol, fazendo a platéia morrer de rir o tempo todo. Aqui, no entanto, não é bem assim.

Esse longa tem até alguns momentos de humor, mas são esparsos durante toda a narrativa, e servem mais para sorrir do que para gargalhar. Ele, inclusive, é bem comedido, sem atuações exageradas. E isso é bom. A partir do instante em que quebra convenções ao anão dar exatamente o que esse tipo de estória geralmente nos oferece, "Viva à Liberdade" foca em outras questões bem mais interessantes, como o desconforto com a vida cotidiana e o nível de falsidade no jogo político.



E, essa estória poderia render, por sinal, um sem número de clichês, o que é evitado no filme. Sua narrativa começa mostrando a rotina do secretário geral do principal partido de oposição italiano, Enrico Oliveri. Cansado de todo o processo, decide simplesmente sumir sem dar maiores explicações. Desesperado, seu assessor Andrea resolve seguir a proposta da esposa de Enrico, e chamar seu irmão gêmeo, Giovani Ernani, para substituí-lo. O problema é que Giovani acaba de sair de um hospício, o que poderá gerar alguns transtornos.

De cara, já se percebe para onde vão certos aspectos na trama: enquanto Enrico descobre o lado bom da vida através de atitudes simples, Giovani, com sua mente inquieta, provocará choques de realidade no meio político, com sua irreverência, honestidade e carisma. Mesmo com esse desenrolar um tanto óbvio, a trama possui diversos positivos. Um deles é expor que os irmãos não são tão diferentes como se imagina, nem é colocado um maniqueísmo forçado onde um é bom é o outro é mau. À maneira de cada um, os dois se mostram ótimas pessoas.


Já a crítica política presente no filme, se não é tão mordaz quanto num "Doutor Fantástico", ao menos coloca interessantes diálogos na boca dos personagens. Quando Giovani está num restaurante, e é confundido com seu irmão por um jornalista que começa a entrevistá-lo, ele diz: "Meus eleitores fazem bem em casarem de mim. Inclusive, me canso com frequência deles. Se os políticos são medíocres, é porque seus eleitores são medíocres. E se são ladrões, é porque seus eleitores são ladrões (ou queriam ser)".

Como se nota, "Viva à Liberdade" é um drama com humor, pontado por alguns momentos sagazes. Possui um bom ritmo, uma direção segura, a cargo de Roberto Andò, e atores que encarnaram tranquilamente seus personagens, principalmente Toni Servillo, ótimo no papel duplo dos irmãos gêmeos. A produção ainda faz muito bem-vindas referências ao cinema (Fellini) e à literatura (Brecht), sempre de maneira leve e nem um pouco pedante.


Este filme pode não ser a melhor comédia (ou drama) de conteúdo crítico dos últimos tempos, mas desempenha muito bem a função de fazer o espectador rir enquanto pensa. E, em ano eleitoral aqui no Brasil, torna-se uma produção ainda mais interessante de se assistir.


NOTA: 8/10

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